Cirrose Hepática

O fígado, maior órgão do corpo humano, é essencial em manter o organismo funcionando adequadamente. Ele remove ou neutraliza toxinas do sangue, produz agentes imunológicos para controlar infecções e remove germes e bactérias da circulação. Além disto, produz proteínas que regulam a coagulação do sangue e produz bile para ajudar na absorção de gorduras e vitaminas. A vida não é possível sem um fígado funcionante. 

Na cirrose, um tecido fibroso substitui o tecido hepático normal, bloqueando o fluxo sanguíneo através do órgão e impedindo que o fígado exerça suas funções como deveria. A cirrose é uma doença com altos custos em termos de sofrimento, perda de produtividade e tratamento, além de ser a oitava causa mais frequente de morte por doenças nos Estados Unidos.

Causas

A cirrose hepática tem várias causas. O alcoolismo e a hepatite C são as mais frequentes em nosso meio:

  • Doença hepática alcoólica: Para muitas pessoas, cirrose é sinônimo de alcoolismo. Na verdade, o abuso alcoólico crônico é apenas uma de suas causas. A cirrose hepática alcoólica geralmente se desenvolve depois de mais de uma década de etilismo pesado. A quantidade de álcool que pode danificar o fígado varia muito de pessoa para pessoa. Em mulheres, beber tão pouco quanto duas a três doses de bebida por dia tem sido considerado suficiente para desenvolver a doença. Em homens, três a quatro doses. É importante lembrar que não há relação entre embriaguez e dano hepático. Ou seja, o fato de a pessoa não ficar embriagada não significa que seu fígado não esteja sofrendo;
  • Hepatite crônica C: É uma das causas mais frequentes de cirrose, ao lado da doença hepática alcoólica. A infecção por este vírus causa inflamação e danos de forma lentamente progressiva ao fígado, o que após vários anos pode levar à cirrose;
  • Hepatites crônicas B e D: O vírus da hepatite B é provavelmente a causa mais comum de cirrose se considerarmos o mundo inteiro. É frequente principalmente no Oriente. A hepatite B, como a C, causa inflamação e danos que ao longo dos anos pode levar à cirrose. O vírus da hepatite D é mais um vírus que infecta o fígado, e ocorre somente em pessoas que já possuem o vírus B;
  • Hepatite autoimune: Este tipo de hepatite é causado por problemas no sistema imune;
  • Doenças herdadas: Deficiência de alfa-1 antitripsina, hemocromatose, doença de Wilson, galactosemia e doenças do armazenamento do glicogênio estão entre as doenças herdadas que interferem com a maneira como o fígado produz, processa e armazena enzimas, proteínas, minerais e outras substâncias de que o corpo necessita para funcionar adequadamente;
  • Esteato-hepatite não alcoólica: Na esteato-hepatite, há um acúmulo de gorduras no fígado. Isto pode inflamá-lo e levar à formação de tecido fibroso - que, com o tempo, pode levar à cirrose. Este tipo de hepatite parece estar associado com diabetes, obesidade e excesso de colesterol no sangue, entre outras condições;
  • Obstrução dos ductos biliares: Quando os ductos que levam a bile para fora do fígado estão bloqueados, a bile fica estagnada e pode danificar o tecido hepático. Em bebês, esta obstrução é mais comumente causada por atresia biliar, uma doença na qual os ductos biliares estão ausentes ou danificados. Em adultos, a causa mais frequente é a cirrose biliar primária, uma doença na qual os ductos se tornam inflamados, bloqueados e fibrosados. A cirrose biliar secundária pode acontecer depois de uma cirurgia de vesícula biliar, se os ductos forem inadvertidamente lesados;
  • Drogas, toxinas, e infecções: Reações intensas a medicamentos, exposição prolongada a toxinas presentes no meio ambiente, e congestão hepática prolongada (por exemplo em casos de insuficiência cardíaca) podem levar à cirrose.

Sintomas

Muitas pessoas com cirrose, nos estágios iniciais da doença, são assintomáticas. Entretanto, com a progressão da substituição das células normais do fígado pela fibrose, a função do órgão começa a ser afetada e o indivíduo pode apresentar os seguintes sintomas:

  • Exaustão;
  • Fadiga;
  • Perda do apetite;
  • Náusea;
  • Fraqueza;
  • Perda de peso.

À medida que a doença avança, complicações podem aparecer. Em algumas pessoas, elas podem ser os primeiros sinais da doença.

Complicações da Cirrose

A perda da função hepática afeta o organismo de diversas maneiras. A seguir, estão problemas comuns, ou complicações, causados pela cirrose:

  • Edema e ascite: Quando o fígado perde a capacidade de produzir uma proteína chamada albumina em quantidade suficiente, líquido se acumula nas pernas (edema) e na cavidade abdominal (ascite);
  • Sangramentos: Quando o fígado diminui a produção de proteínas necessárias para a coagulação do sangue, o indivíduo passa a apresentar sangramentos e equimoses (“roxos”) com mais facilidade;
  • Icterícia: Icterícia é um tom amarelado dos olhos e da pele que aparece quando o fígado não consegue mais processar e eliminar as bilirrubinas de maneira eficiente;
  • Prurido: Produtos da bile depositados na pele podem causar prurido intenso (coceira);
  • Toxinas no sangue ou cérebro: Um fígado danificado não consegue remover toxinas do sangue, causando seu acúmulo na circulação. Isto pode perturbar o funcionamento do sistema nervoso central, causando mudanças de personalidade, coma e até mesmo a morte. Sinais do acúmulo de toxinas no cérebro incluem perda do cuidado pessoal, esquecimentos, problemas de concentração, mudanças no padrão de sono e confusão mental;
  • Sensibilidade às medicações: A cirrose diminui a capacidade do fígado de “filtrar” os medicamentos do sangue. Como o fígado não remove as drogas da circulação na velocidade habitual, elas agem por mais tempo do que o esperado e podem se acumular no organismo. Isto torna as pessoas mais sensíveis aos medicamentos e mais propensas a apresentarem efeitos colaterais;
  • Hipertensão portal: Normalmente, o sangue proveniente dos intestinos e do baço é levado ao fígado pela veia porta. No entanto, a cirrose dificulta o fluxo de sangue através desta veia, aumentando a pressão dentro dela. Esta condição é denominada hipertensão portal;
  • Varizes de esôfago: Quando o fluxo de sangue através da veia porta está dificultado, o sangue proveniente do baço e dos intestinos é desviado para outras veias, que passam pelo estômago e pelo esôfago. Como estas veias não foram “projetadas” para receber tanto sangue, elas acabam por se dilatar, formando varizes. O problema é que estas varizes podem se romper, causando hemorragias graves, com elevada taxa de mortalidade;
  • Problemas em outros órgãos: A cirrose causa problemas no sistema imune, deixando a pessoa mais vulnerável a infecções. O fluido no abdome (ascite) pode se infectar com bactérias normalmente presentes nos intestinos. A doença pode também causar alterações na função dos rins - levando até mesmo à insuficiência renal.

Diagnóstico

O médico pode diagnosticar cirrose com base nos sintomas, exames complementares, pela história médica do paciente, e pelo exame físico. Por exemplo, durante o exame físico, o médico pode perceber que o fígado está maior ou mais endurecido do que o habitual e pedir exames de sangue que demonstrarão se há doença hepática presente.

Exames de imagem como ultrassonografia, tomografia computadorizada podem trazer dados adicionais, assim como a inspeção do fígado através da videolaparoscopia.  O diagnóstico pode ser confirmado pela realização de uma biópsia hepática ou de testes não invasivos como a elastografia.

Tratamento

O dano hepático da cirrose geralmente é pouco reversível, mas o tratamento pode interromper a progressão da doença e reduzir suas complicações. O tratamento dependerá da causa da cirrose e das complicações presentes. Por exemplo: cirrose causada pelo álcool é tratada pela cessação do consumo de álcool.

Tratamento de cirrose decorrente de hepatites envolve medicamentos usados para o tratamento destas, como antivirais para hepatites por vírus e corticóides para hepatite auto-imune. Ou seja, o tratamento dependerá da cusa subjacente. Em todos os casos, independente da causa, seguir uma dieta saudável e editar o álcool são essenciais, pois o corpo necessita de todos os nutrientes que puder obter, e o álcool levará apenas a  mais dano hepático.

O manejo das complicações, quando presentes, também faz parte do tratamento. Por exemplo, para ascite e edema, o médico poderá recomendar uma dieta pobre em sódio e o uso de diuréticos, que retirarão fluidos do organismo. Antibióticos serão prescritos para infecções, e vários medicamentos podem aliviar o prurido.

Proteínas levam à formação de toxinas no aparelho digestivo, e por isto uma dieta pobre em proteínas ajudará a diminuir o acúmulo de toxinas na circulação e no cérebro. O médico poderá também prescrever laxantes para evitar a absorção de toxinas a partir dos intestinos.

Para a hipertensão portal, poderão ser prescritos medicamentos que diminuem a pressão no sistema porta, como beta-bloqueadores. Se as varizes sangrarem, pode ser realizado tratamento endoscópico com esclerose ou ligadura elástica. Estes tratamentos estarão indicados tanto para fazer parar o sangramento quanto para prevenir ressangramentos.

Quando não se consegue controlar as complicações ou quando o fígado foi danificado a ponto de sua função se tornar gravemente comprometida, um transplante hepático estará indicado. No transplante, o fígado doente é removido e substituído por um sadio. Atualmente, de 80 a 90% das pessoas sobrevivem ao transplante.

As taxas de sobrevivência têm melhorado muito nos últimos anos em virtude do uso de drogas como a ciclosporina e o tacrolimus, que suprimem o sistema imune e impedem que ele ataque e danifique o novo fígado.

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